Foto: Divulgação
Região das águas, a Amazônia tem forte tradição fluvial. Milhares de embarcações cortam rios, igarapés e furos floresta adentro. Cada uma delas é marcada por belas e singulares caligrafias coloridas, criadas pelos abridores de letras. Imbuído do propósito de fortalecer os saberes desses artistas populares, nasce o Instituto Letras que Flutuam – um marco histórico por ser o primeiro instituto voltado à cultura ribeirinha no Brasil.
O projeto será apresentado à imprensa em coletiva marcada para quarta-feira, 14, de 10h às 12h, no Centro Bienal das Amazônias, no bairro da Campina, em Belém. O encontro contará com a presença de dez mestres abridores de letras vindos de diversas regiões do Pará e membros do Conselho de Associados do Instituto. O IFLQ tem patrocínio da Equatorial Pará, por meio da Lei Semear.
Já a programação de lançamento será realizada de 15 a 17 de agosto, com exibição do filme “Marajó das Letras” e debates abertos ao público, além de oficinas voltadas a alunos de escolas das ilhas da capital e o inédito encontro estadual de abridores de letras, quando os artistas irão criar um painel coletivo com as caligrafias amazônicas.
O Instituto é resultado de 15 anos de pesquisa, documentação, divulgação e geração de renda junto aos abridores de letras no Pará. A cultura visual, e dentro dela a representação gráfica, tem tanta importância para a Amazônia quanto a música, a dança, a comida, pois reflete saberes que são exclusivamente locais.
O Instituto foi idealizado por Fernanda Martins, pesquisadora nas áreas de Tipografia e História do Design, em especial na Amazônia, com formação acadêmica na Universidade do Rio de Janeiro, Universidade Federal do Pará, Universidade de São Paulo e Escola de Design de Basel, na Suíça.
A ILQF é uma realização do Mapinguari Design e Letras Que Flutuam, em parceria com o Centro Cultural Bienal das Amazônias, Instituto Peabiru e Fundação Escola Bosque (Funbosque).
Mapeando os abridores
A tradição, que surge na região por volta de 1930 e se estabelece em 1960 com a obrigatoriedade de identificação dos barcos, diz respeito a todo um universo pelas águas. Segundo o pesquisador e ativista socioambiental João Meirelles Filho, autor do Livro de Ouro da Amazônia, navegam na região cerca de cem mil barcos, em sua maioria embarcações acanhadas, de pequeno porte, construídas artesanalmente para o uso familiar. São estes os que mais se utilizam desta tradição de pintura popular.
Em busca de lançar luz sobre este fenômeno, o projeto Letras que Flutuam surge em 2004. Desde então, mapeou mais de 100 abridores de letras em Belém, Icoaraci, Abaetetuba, Igarapé Miri, Barcarena, Soure, Salvaterra, Ponta de Pedras, Curralinho, São Sebastião da Boa Vista e Breves.
Nestas incursões, o projeto promoveu ações de geração de renda, oficinas, workshops, capacitação para o mercado, lançou livro e dois documentários sobre o fazer tradicional – registros valiosos para a memória deste saber popular e a circulação da cultura por diversas regiões do país, que passaram a conhecer os mestres abridores.
Direitos autorais contra o plágio
A difusão desse vocabulário imagético ribeirinho o fez reconhecido em todo o Brasil. Isso se comprova pela enorme quantidade de produtos que estão utilizando as letras decorativas da Amazônia, sem contar produtos publicitários e marcas de empresas. Porém, isso não se refletiu na ampliação do mercado de trabalho aos abridores de letras, que são, originalmente, os autores dessa obra singular, mas permanecem invisíveis, já se tornam cada vez mais frequentes os episódios em que que designers e publicitários plagiam o trabalho destes artistas amazônicos.
O nascimento do Instituto solidifica e garante a continuidade dos esforços de promoção, preservação e proteção legal em prol dos artistas populares. Para isso, conta com um Conselho de Associados que discute e decide seus planos de ação. São profissionais de diversas frentes, como Maria Dorotéia de Lima, ex-superintendente do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) no Pará; a jornalista Adelaide Oliveira; e Sâmia Batista, designer, pesquisadora e produtora cultural.
Encontro inédito dos artistas
A programação de lançamento do ILQF promove o encontro inédito dos abridores de letras do Pará, que desde 2018 passaram a se conectar virtualmente por meio de grupo de rede social do Letras que Flutuam. Agora, finalmente, os mestres irão se conhecer pessoalmente, um fortalecimento de vínculo fundamental para a resistência da comunidade de artistas populares.
Para perpetuar esse saber, a programação promove ainda oficinas de abertura de letras ministradas pelos mestre a alunos da escola pública de Caratateua e Cotijuba, da região das Ilhas de Belém.
Haverá ainda a exibição do documentário “Marajó das Letras”, fruto da segunda etapa do projeto Letras que Flutuam, que mapeia os mestres pintores de barcos da ilha do Marajó.
Confira a programação do Ciclos de Atividades:
Local: Centro Cultural Bienal das Amazônias, R. Sen. Manoel Barata, 400 – Campina, Belém
15 de Agosto, quinta
Dia 1 – 1º Encontro de Formação para os Artistas Abridores de Letras
9h às 18h
Sala Multiuso
16 de Agosto, sexta
9h às 17h30
Sala Multiuso
Dia 2 – 1º Encontro de Formação para os Artistas Abridores de Letras
14h às 17h | Pintura – Troca de experiências
Programação aberta ao público
18h30 às 20h
Hall de Entrada
Cine Letras + Bate-Papo
Bate-papo com Fernanda Martins e Sâmia Batista e os Abridores de Letras
17 de Agosto, sábado
9h às 12h
Sala Peq/ Biblioteca
Ciclo de Oficinas 1: Abertura de Letras
Oficina voltada para alunos da escola pública da região das Ilhas de Belém
Ciclo de Oficinas 2: Abrindo Paisagens
Oficina voltada para alunos da escola pública da região das Ilhas de Belém